sábado, setembro 30, 2006 |
PALAVRAS QUE INQUIETAM (15)
· Para nos auxiliar também deixo aqui a palavra sempre sensata de Antonio Vieira, que desde os idos do século XVII ficou famoso pelos lapidares depoimentos sobre o ser humano. Acerca dos ditos e indignos representantes do povo, eis o que dizia o abnegado padre : "Tempos houve em que os demônios falavam, e o mundo os ouvia; mas depois que ouviu os políticos ainda é pior mundo". Sem comentários, sem comentários... Mais adiante uma sentença da época, lógico, para fecharmos o cerco ao nobre Pe. Vieira : "Os homens, com suas más e perversas cobiças, vêm a ser como os peixes que se comem uns aos outros". E olhe que tal frase foi pronunciada, claro, antes do ano de 1697, quando ele morreu no dia 18 de julho. Não se atrela a uma máxima profética e que se encaixa nos tempos atuais? Notável, simplesmente notável...
· E como uma ilustração da demagogia dos políticos tem-se exemplo e clímax no excelente filme de John Ford O homem que matou o facínora. Na significativa cena em que um cidadão público pretende iniciar seu discurso, ele abre uma folha na frente de todos e depois a amarrota e joga-a no chão. Um senhor atento apanha o papel e vê que o mesmo está em branco. Então o velho político iniciará o malfadado discurso de improviso, ignorando a presença do perspicaz observador. Quantos de nós não ficamos na inocência em atitudes feitas às ocultas, hein?
· Saindo um pouco da esfera política, recorremos ao polêmico cineasta Rainer W. Fassbinder, alemão incansável, passional e precoce. Realizador de fitas excelentes como Despair - uma viagem para a luz e O casamento de Maria Braun, entre outras, parece não ter conseguido escapar de sua sina. E morreu moço ainda, aos 36 anos, devido mais a uma vida de drogas e escândalos, deixando, porém, seu legado às gerações futuras nos mais de 40 filmes que dirigiu. E dizia pra quem quisesse ouvir: "Posso dormir quando estiver morto". Que o genial homem, portanto, depois de uma conturbada e curta existência, durma em paz.
ESPAÇO LIVRE
Publico hoje o "Soneto nº. 3", do escritor e poeta natalense Nei Leandro de Castro, autor do romance "As pelejas de Ojuara", que vai ser adaptado para o cinema e já com as filmagens a serem iniciadas.
SONETO Nº 3
Um é pouco. Dois, bom. De vez em quando um casamento a três quebra a rotina. Uma mulher para dois se desatina nos jogos duplos em que vai impondo
a força que ela tem. Boca e vagina engolem os que vão lhe penetrando. E os machos cumprem, machos, sua sina: zangões felizes de morrer gozando.
O casamento a três sempre dispensa juras de amor, promessas, má consciência ou toda e qualquer forma de contrato.
É importante ser um casamento que viva intensamente o seu momento de amor carnal num ato ou muitos atos.
sexta-feira, setembro 22, 2006 |
PALAVRAS QUE INQUIETAM (14)
* Para o escritor norte-americano Edgar Allan Poe (1809/49), "as realidades do mundo afetavam-me como visões, apenas como visões, enquanto que as idéias loucas da terra dos sonhos se tornavam, por sua vez, não o material de minha vida cotidiana, mas, realmente, minha inteira e única existência". Porque, como bem disse Heidegger, "o ser humano só pode definir-se, a partir de seu existir, isto é, de sua possibilidade de ser ou não ser o que ele é". Afinal de contas, de acordo com Kierkegaard, "não se trata tanto de escolher querer o bem ou o mal, mas de escolher o querer", pois sabemos que "vivemos num mundo... cujo o porquê, cujo sentido, procuramos em vão"(Edmund Husserl, já citado aqui). Aliás, depois de toda celeuma, voltamos a Allan Poe, que, talvez decepcionado, ficou descrente do ser humano, para afirmar convicto: "os homens, em geral, tornam-se vis gradualmente". E por causa disso, interrogou-se a si mesmo, manifestando-se que "na verdade, não terei vivido num sonho?", questionando, por fim, os absurdos deste mundo.
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* O polêmico cineasta Pier Paolo Pasolini, autor de filmes importantes como Teorema, O Evangelho segundo São Mateus e Decameron, dizia - falando acerca de um possível anonimato de autores vivos - que "enquanto um homem não morre não se sabe bem o que ele fez". E é uma frase que desperta vivo interesse, principalmente quando sabemos de sua autenticidade e atualidade. Pois existe muita gente boa viva por aí, mas que fica quase sempre no esquecimento. Um dia, talvez, quem sabe, quando for embora, possa ser reconhecida.
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* Vejam que primor de texto dito pelo personagem e crítico De Witt (vivido pelo ator George Sanders) no filme A malvada : "Nós temos em comum... desprezo pela humanidade, incapacidade de amar ou ser amados, ambição insaciável - e talento. Merecemos um ao outro". Não calharia extraordinariamente bem se saísse da boca de um desses sujos políticos (e homens públicos) em confabulações com seu interlocutor? Ou, no caso, em especial, uma interlocutora?
ESPAÇO LIVRE
Compartilho hoje com vocês o bonito poema "À solidão das mulheres", do poeta natalense Eduardo Gosson, responsável pelo sarau que se realiza toda a última quarta-feira de cada mês em uma das livrarias de nossa cidade.
À SOLIDÃO DAS MULHERES
À solidão das mulheresda ilha de Quessantque tecem fios de lãde ovelhas marinhase, pacientemente, aguardam seus marinheirosinvisíveisÀ solidão das mulheressiberianas que,solidariamente,produzem o pão de cada diaÀ solidão das mulheresnórdicas que,na sobriedade dos gestos,descotidianizam a vidaÀ solidão das mulheres que, dos becosescuros de Chicago,alimentam o "sonho"americanoÀ solidão das mulheresda África sentida -o povo tomou o caminhoda barca -À solidão das mulheres- eu canto!
sábado, setembro 16, 2006 |
PALAVRAS QUE INQUIETAM (13)
* Dizendo que "a finalidade de todo governo é muito simples, ou seja, ministrar justiça", James Madison (1751/1836), outro estadista americano, ensaiou: "todos os homens são iguais e dotados de direitos naturais", porque, lembrou ele, "a fonte suprema do poder devia jorrar do consentimento do povo". Ficou infeliz ao saber da "diversidade de opinião entre os homens de igual integridade e discernimento", sendo, então, para ele, uma "triste prova da falibilidade do julgamento humano". E acercado de tantas falsas prerrogativas, embora Benjamin Franklin dissesse no final da vida que "não posso admitir o aniquilamento das almas", Thomas Jefferson arrematou dizendo ser o fim de todas as coisas "uma grande aventura nunca experimentada pelos vivos e não relatada pelos mortos".
* Nascido em 1214, Roger Bacon já dizia: "creio que a humanidade aceitará como regra axiomática o direito de investigar. É esse o credo dos homens livres - a oportunidade de ensaiar, o privilégio de errar, a coragem de tornar a experimentar". Completava em seguida que, "ele, o homem, devia seguir a trilha da humildade, se quisesse procurar a verdade". Mas, fantasiando um pouco a frase seguinte e "embriagado e arrebatado pelas doces seduções desta sereia, que estava constantemente deitada a seu lado, o homem muitas vezes se esquecia de comer e beber" (Plutarco, filósofo e prosador grego do período greco-romano)), provando o que dissera Bacon de que ele, o homem, não fora feito para a natureza, mas a natureza é que fora feita para ele. Afinal, "só o homem racional pode pôr um freio à competição natural da força bruta", dissera tempos depois Thomas Huxley.
* E assim vamos vivendo, morrendo, vivendo, até que "o tempo, que tudo transforma, transforma também o nosso temperamento. Cada idade tem os seus prazeres, o seu espírito e os seus hábitos" (Nicolas Boileau, escritor francês), porque "ao nascermos, a terra recebe-nos; nascidos ela nos alimenta; depois de mortos, acolhe-nos", já finalizava o grande Plínio, mais conhecido como Plínio, o Velho, cientista e historiador que morreu na erupção do Vesúvio em 79 d.C.
ESPAÇO LIVRE
EMBATE
Desnudo-te, oh formosa mulher! E cubro-a com meu corpo faminto teu sexo a latejar de inquietude em um emaranhado de ambições.
Na medrosa esperança de seduzi-la eis o meu gozo a desiludir-me do amante sôfrego e tenaz.
Naquela paixão avassaladora de amor e ódio a destruir nossos breves e intermitentes sentimentos.
A felicidade, um momento fugaz. O sofrimento, uma causa final.
Bené Chaves
sábado, setembro 09, 2006 |
PALAVRAS QUE INQUIETAM (12)
* Falando sobre as formas de governo, o que diria o estadista americano William Penn(1644/1718)? Comentava que "todo governo é livre quando são as leis que governam e o povo participa dele", para logo em seguida ditar: "obediência sem liberdade é escravidão". Em resumo, sentenciava que "o governo depende mais dos homens do que dependem os homens do governo". E, sendo "a terra boa... o ar claro e leve, as fontes d'água abundantes e as provisões fáceis de obter", dizia o mesmo, tudo isso redundaria numa vida saudável para muitos, desde que fosse primordial "transformar o mundo num lugar melhor para nele se viver, tanto material como moralmente", arrematou depois Benjamin Franklin, nascido em 1706. Ao dizer que "as massas são feras famintas, exploradas, espezinhadas e espancadas", Alexander Hamilton, outro estadista americano, complementou: "os vícios dos ricos se harmonizam melhor com um bom governo do que os vícios dos pobres". E diante disso tudo, tentando analisar os problemas que surgiam, essa ou aquela forma de governar, John Adams - estadista americano nascido em 1735 - permaneceu indeciso e fantasiou: "ando vagabundeando sozinho, a tecer considerações. Penso, matuto, rumino. Seguidamente perco-me em sonhos e profundas meditações. Os objetos que me cercam são por demais grandiosos e multifários para a minha compreensão"... O que diríamos nós, então, de tais considerações?
* Já o filósofo Jean-Jacques Rousseau, nas suas experiências na república calvinista de Genebra, chegou a uma fundamental conclusão de que "quando um povo é 'representado' por deputados, ele se torna alienado de sua própria unidade coletiva e desse modo deixa de ser um povo". Olhaí congressistas do mundo inteiro! O que dizer de tão sábia e inteligente afirmação? O célebre homem sabia do que estava ao seu redor. E triste país este nosso de tantos políticos corruptos. O povo que se cuide, o povo que se cuide...
ESPAÇO LIVRE
EFÊMERO
Ah... Amar! Verbo transitivo...
Transita no calor de nosso sangue, na veia do desejo de homens e mulheres. É a palavra-chave da vida na trilha dos seres humanos mansidão do doar e receber no fluir de breves ternuras razão de um longo momento e instável sentimento. A parte principal deste labirinto de emoções.
Ah... Amar! Verbo intransitivo...
Bené Chaves
sábado, setembro 02, 2006 |
PALAVRAS QUE INQUIETAM (11)
Þ O célebre cientista Albert Einstein chegou a dizer que "preferiria ser cortado em pedaços a tomar parte em tão abominável ação", referindo-se aos atos da guerra de um modo geral. Odiava também a riqueza. E dizia: "estou absolutamente convencido de que nenhum dinheiro pode ajudar a humanidade a progredir", pois o que "o mundo mais necessitava nunca poderia se comprar com ele". Tinha consciência de que os antigos ódios continuavam a fermentar o ser humano, achando conseqüentemente que "precisava-se era de paz permanente e boa vontade constante". Pois é, meu caro Einstein, o problema é que não existe nem uma coisa e nem outra. O que predomina são os contrários. Porém, depois arrematava a máxima seguinte: "é óbvio que nós existimos para os nossos semelhantes - para aqueles de cujos sorrisos e bem-estar depende a nossa felicidade, e depois aos que nos são desconhecidos", sabendo também ele que "nas crianças reside a esperança do mundo". Contemporizando a sua revolta de como resistir ao universo inteiro, obteve-se do filósofo Ralph W. Emerson (1803/82) a imediata resposta: "se um homem se apegar resolutamente aos seus instintos, o mundo acabará por ceder a ele".
Þ E o que diria a escritora francesa Simone de Beauvoir, eterna companheira de Sartre, diante de tantas controvérsias? Ela, que nasceu no início do século XX, acreditando que "o mundo não parecia mais um lugar seguro", afirmava depois com soberania: "o que o tornava sombrio era perfeitamente o fato de que minha imaginação amadurecia", pois revelava a seguir que "os pensamentos vão e vem como bem entendem dentro de nossa cabeça". E aquele período de vida para ela teria de acabar, mas "isso não parecia verossímil", dizia, talvez ainda acreditando em algo melhor. Todavia, "a angústia é que me estimulara; descobrira uma saída para o desespero porque a procurava com ardor", disse então. E, nesse caso, "a amizade e o amor eram a meus olhos algo definitivo, eterno, e não uma aventura precária", dizia com sobriedade. Depois confirmou: "só o sono me libertava". E diante disso tudo somente lhe restaria sustentar que existia de duas maneiras, pois "levando minhas repugnâncias até o vômito, meus desejos até a obsessão, um abismo separava as coisas de que gostava das de que não gostava". Citou ainda, contrariando o conceito de muitos que "detestava as rotinas e as hierarquias, as carreiras, os lares, os direitos e os deveres, todo o aspecto sério da vida".
ESPAÇO LIVRE
CONFIANÇA
No mar revolto e profundo derramo minhas lágrimas esperando removê-las e transformá-las na virtude de uma vida de amor.
E no azul cósmico e infinito carregá-las como um pássaro conduz sua presa ao ninho a saciar sua fome.
Numa liberdade que se ergue faiscando gotículas estelares distante de perenes incertezas.
Bené Chaves
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