perfil
Bené Chaves <>, natalense, é escritor-poeta e crítico de cinema.
Livros Publicados:
a explovisão (contos, 1979)
castelos de areiamar (contos, 1984)
o que aconteceu em gupiara (romance, 1986)
o menino de sangue azul (novela, 1997)
a mágica ilusão (romance, 2001)
cinzas ao amanhecer (poesia, 2003)
Sonhadores

Você é nosso visitante de número


Obrigado pela visita!

links

a filha de maria nowacki
agreste
arabella
ariane
balaiovermelho
blog da tuca
clareando idéias
colcha de retalhos
dora
entre nós e laços
faca de fogo
janelas abertas
lá vou eu
letras e tempestades
litera
loba, corpus et anima
maria
mudança de ventos
notícias da terrinha
o centenário
pensamentos de laura
ponto gê
pra você que gosta de poesia
proseando com mariza
rua ramalhete
sensível diferença
su
tábua de marés
umbigo do sonho
voando pelo céu da boca

zumbi escutando blues

sonhos passados
agosto 2004 setembro 2004 outubro 2004 novembro 2004 dezembro 2004 janeiro 2005 fevereiro 2005 março 2005 abril 2005 maio 2005 junho 2005 julho 2005 agosto 2005 setembro 2005 outubro 2005 novembro 2005 dezembro 2005 janeiro 2006 fevereiro 2006 março 2006 abril 2006 maio 2006 junho 2006 julho 2006 agosto 2006 setembro 2006 outubro 2006 novembro 2006 dezembro 2006 janeiro 2007 fevereiro 2007 março 2007 abril 2007 maio 2007 junho 2007 julho 2007 agosto 2007 setembro 2007 outubro 2007 novembro 2007 dezembro 2007 janeiro 2008 fevereiro 2008 março 2008 abril 2008 maio 2008 junho 2008 julho 2008 agosto 2008 setembro 2008 outubro 2008 novembro 2008 dezembro 2008
créditos

imagem: Walker
template by mariza lourenço

Powered by MiDNET
Weblog Commenting and Trackback by HaloScan.com

 

 

 



quinta-feira, novembro 29, 2007





DUPLO ORGULHO




Acho que vocês não imaginam como era Gupiara tempos idos. Painhô tinha consciência disso e vivia me dizendo. E o seu apreço por Mainhô superava as menos imaginadas precauções e situações. No resguardo dela ele quase não saía do leito, ali colado na minha mãe e tratando do nascimento dos filhos. De beijinhos no rosto pra não variar. Ele era muito carinhoso, tratava sua esposa com afeição própria de um homem simples. Depois ele me contou tal história bem ao seu jeito.
Com coragem de fazer inveja a qualquer uma, Mainhô nunca foi parir em uma maternidade ou hospital para tal fim. Teve as seis crianças no quarto dela, ali mesmo, com apenas Tia Chica fazendo seus gostos e iguarias para o momento e a parteira zelosa que não teve igual. Sempre foi uma mulher destemida, meio rústica, nascida pras bandas daquele sofrido interior de várzea agreste.
E, portanto, eles, os filhos, foram nascendo em intermitências regulares, cada um com sua aparência própria, lógico. Eu, tido, já dito aqui, como de belo porte, pesei densos cinco quilos e duzentos gramas, com cinqüenta e dois centímetros. E era de se imaginar, pois minha mãe carregou-me com uma barriga que não tinha mais tamanho. Seria o início, então, de uma trajetória.
Gupiara tinha, apesar de tudo, a favor de si, o fato de ser uma cidade peculiar. E isso fazia muito bem ao ego daquela família. Além disso, não havia quase poluição, o ar limpo diluía indícios de possíveis impurezas. Sorte para todos, nome para o lugarejo.
Painhô gostava mesmo de prosear. E me dizia que o homem é o doador e a mulher a receptora. Sendo assim, quem dá tem mais poder. Parecia um aforismo ditado pela natureza e suas esquisitices. E o homem se orgulha, completava, se envaidece, doa a quem doer. Ele doa. Ela recebe. Pois sim! Sem isso ocasionar nenhum machismo de sua parte.
Falavam nos arredores de Gupiara, as más e também boas línguas, que muitos filhos acarretam verdadeiros deslizes. Eram as sabedorias surgindo disfarçadas e soberanas. Porém, minha mãe os teve mesmo assim. E tanto ele como ela eram felizes naquele momento. Estavam todos nascendo para serem criados pelo mundo.
Tardinha daquele dia, a gente, meu filho, via o entorpecimento do sol, as nuvens espalhadas cobrindo-o parcialmente e presumindo-se uma proteção ao todo-poderoso raio de luz. Surge, então, o objeto em detrimento do humano, que apodrece com os anos adormecendo como uma criancinha acariciada ao colo da mãe. Quando ela acorda, vê um velhinho sentado à beira do rio catando grãos de areia. Olha para um lado e outro e exclama estupefata: mas como a vida é curta! Ontem mesmo vi um lindo menino a brincar despreocupado e feliz.
Porém aí, nesta parte, eu já emendei delirando, pois essa estória foi vista em sonhos. Adormecera no finalzinho do dia antes de Painhô terminar seu relato.



ESPAÇO LIVRE


MELANCOLIA


Na ambigüidade existencial
não vi o ontem
desconheço o hoje
e também o amanhã.

E nestas três etapas da vida
não amanheço, nem anoiteço.
Entristeço!

Deslumbrando um agridoce olhar
na inquietude do tempo.


Bené Chaves



quinta-feira, novembro 22, 2007





Foto de Maaria Antonia Bueno, in Olhares.com


VERSOS QUE CANTAM E ENCANTAM (19)



De José Fernandes de Paula:

Eu sempre fui feliz
Vivendo só, sem ter amor
Mas o destino quis
Roubar-me a paz de sonhador
E pôs num sonho meu
Um olhar de ternura
De alguém que mesmo em sonho
Roubou minha ventura
Sonhei com esse alguém
Noites e noites sem cessar
Por fim alucinado
Fui pelo mundo a procurar
Aquele olhar tristonho
Da cor do luar
Mas, tudo foi um sonho
Pois, não pude encontrar
Mas, na espinhosa estrada desta vida
Sem querer, um dia,
Encontrei com esse alguém
Que tanto eu queria
Esse alguém que mesmo em sonho
Eu amei com tanto ardor
Não compreendeu a minha dor
Foi inspirado então,
Na ingratidão de quem amava tanto
Que fiz este triste valsa
Triste como o pranto
Que me mata de aflição
Bem sei que esta valsa será
A minha última inspiração.

Obs: Versos da música 'Última Inspiração' (1940), valsa do compositor José Fernandes de Paula, conhecido no meio artístico como Peterpan, nascido em Maceió(AL) no dia 21 de janeiro de 1911. Foi para o Rio de Janeiro com 11 anos e seguiu o seu itinerário musical. Tempos depois casou-se com a Nena Robledo, que era irmã da Emilinha Borba, uma das mais famosas cantoras de músicas do carnaval da época, década de 40/50. Peterpan compôs também sambas e marchinhas para os festejos de Momo.
Gravada inicialmente por João Petra de Barros(1914/47, que suicidou-se aos 33 anos), em 1940, a valsa em questão fez muito sucesso. E depois também alguns cantores a gravaram, como o Carlos Galhardo, chamado de o 'rei da valsa' no período.
José Fernandes de Paula morreu em 28 de abril de 1983 no Rio de Janeiro.


ESPAÇO LIVRE




TRANSE


De manhã degusto-me
de ti.

De tarde degusta-te
de mim.

À noite degustamos
entre nós.

Em um estertor de fome
e não comiseração.



Bené Chaves

(Quadro ao lado do pintor Edvard Munch)



quinta-feira, novembro 15, 2007

O texto abaixo já foi publicado aqui. Sai novamente para os que não tiveram oportunidade de lê-lo na ocasião, no ano de 2004.
MAIS SONHOS

Certo dia, meu filho, achei tudo esquisito quando foram colher seu sangue. Olhei ao redor e vi um médico baixinho ao lado de enfermeiras apavoradas e dando faniquito ao ver uma seringa saindo de sua veia com sangue azul a fluir com leveza. Depois via aquele líquido coagular ante olhares atônitos. Certamente sua mãe não acreditara quando vira dias atrás aquela maldita mancha no lençol.

Era um caso anormal, claro, pra estudo detalhado e parecendo até uma imaginação. Mas, teriam peritos no assunto, para ocorrências como essa, de sangue azul em um ser humano? Seria uma incógnita se aproximando... Painhô pensou até em uma paranormalidade ou algo em terreiro de macumba. Embora não acreditasse neste lado empírico da vida. Todavia, aquele líquido de cor nas veias não denunciava em nada as relações ambientais de ninguém. O fato, por si só, seria uma louca aberração da natureza. Ela que, inclusive, já nos tem mostrado e demonstrado o quanto é singular.

Então se falava: fulano tem sangue azul. Quer dizer: é uma pessoa importante. Nada de substância diferente no corpo. No caso aqui, em particular, seria um problema mais grave. Ela, a pessoa, lógico, detém a excentricidade de um ser não ser habitual. E daí toda a celeuma que o caso trouxe em si.

Diziam, desde tempos idos, que um rei ou uma rainha tinham sangue azul, porém era uma referência no sentido figurado, evidente. Uma tradição do tempo da monarquia, infelizmente ainda posta em prática em alguns países de nossa dita civilização. De qualquer maneira a criança em questão não fazia parte de trono algum, a vida apenas lhe teria pregado essa peça invulgar. E como na existência às vezes aparecem fatos estranhos, levou-se o caso como mais uma aberração e ironia da mesma.

Então, o dia seguinte amanheceu turbulento. Dentro de um buraco, numa enorme montanha, saiu aquele menino a chorar. Vagou e sentou-se à beira de um rio, começando a catar peixinhos que fluíam na água límpida e descorada. Mas, o riacho foi ficando azul e correndo paralelo com as soluçantes lágrimas. E o estreito córrego terminou vivamente colorido, numa mesclagem inesperada e desproposital do infeliz mancebo.

Porém acordei, meu filho, assustado e dando berros e vendo sua mãe do meu lado bastante aflita. Acho que tive um longo pesadelo. E depois fiquei a imaginar como seria uma pessoa com sangue de outra cor no organismo. Talvez uma completa extravagância. Todos ali deveriam temer quanto a isto. Ou não? Acredito que sim. E fica somente o fato como uma tradição e em sentido figurado. Os monarcas que o digam.

As pessoas nascem, crescem, morrem. É um logicismo ilógico da vida. Vê algum sentido nisso? Homens, mulheres, crianças... Crescem os frutos e a raiz apodrece. O caule perde o viço, torna-se perro. E depois ninguém fica sabendo o que aconteceu. Ou se aconteceu.

Gupiara um dia desaparecerá, todos desaparecerão, tristes sinas. Ela foi. É. Não é. As lembranças marcam os rostos de seus habitantes. E os nossos também. Surgirá, no interstício, uma urbe diferente, desumana, alheia aos anseios de um povo. Porém, espero ainda encontrar alhures a província desaparecida. Será que terei tal alegria? No aspecto da vivência ser um sonho, penso que sim. Pois na realidade ela pode ser apenas, entre risos e lágrimas, uma foda atrás da outra...



ESPAÇO LIVRE

A meu pedido, a amiga e poetisa Carmen Vasconcelos (RN) enviou-me uma pequena amostra de sua poesia. Compartilho com vocês dos três poemas da mesma. Espero que tenham uma boa leitura.


A POESIA DE CARMEN VASCONCELOS(RN)



A RAINHA DE SABÁ


Não Senhor,não tenho ganas de sabedoria.

Apaziguai minhas dúvidas,

minhas zangas,

mas com inocência ou beatitude...

ou até com santidade,

para que possa, eu também,

assim como vós,

viver contorcida de amor.



TIRÉSIAS


Eu fui o suor do Deus,

fui suas lágrimas,

fui um anjo feito do seu sangue.


E assim me apossei do segredo sagrado.


Furaram-me os olhos,

feriram-me com desonras,

mas não me roubaram o segredo.


Decretaram pena de exílio

à doida que havia em mim.

Ela foi degredada, banida,

mas não me arrastou o segredo.


Continuo macho e fêmea,

permaneço com gula de amor.

Sei que gozo não se mede,

nem para pedir perdão,

nem para afagar os deuses.


MEDOS


Aonde vou

ando com meus medos

meus medos me aquecem feito febres


Eles perduram como avisos

pendurados nos meus desvãos

fincados nos meus desvios


Mas nas tabuletas coradas de ferrugem

já não leio meus medos corroídos

eu os lanço ao mundo

não como flechas envenenadas

não como espadas, não como punhais

não como se fossem estiletes


Lanço meus medos como revérberos

de embaraços


Meus medos andam comigo como credos

meus dedos desfiam

as lãs

os rosários dos meus medos

neles me fio


Não tenhas medo, meu amor, não temas

não tenhas medo dos medos que eu tenho

despachado nas encruzilhadas.______



quinta-feira, novembro 08, 2007






VERSOS QUE CANTAM E ENCANTAM (18)

De Herivelto Martins:
Barracão de zinco
Sem telhado, sem pintura
Lá no morro,
Barracão é bangalô.

Lá não existe
Felicidade de arranha-céu,
Pois quem mora lá no morro
Já vive pertinho do céu.

Tem alvorada, tem passarada
Alvorecer
Sinfonia de pardais
Anunciando o anoitecer.

E o morro inteiro no fim do dia
Reza uma prece, Ave Maria...
...


Ave Maria... Ave.
E quando o morro escurece
Eleva a Deus uma prece
Ave Maria...
Ave Maria... Ave... Maria.

Obs: Versos da música 'Ave Maria no Morro' (1942), de Herivelto Martins, compositor nascido no Rio de Janeiro em 30 de janeiro de 1912 e que com apenas três anos apresentava-se declamando. E dizia: 'Nasci pra namorar/ Toda moça bonita que eu vejo/ Dá vontade de casar'. O seu pai, o agente ferroviário Félix Bueno Martins, era um apaixonado pelo teatro. E promovia grupos de teatro amador. Foi, então, depois que o Herivelto conheceu o compositor José Luis da Costa, o Príncipe Pretinho, que lhe deu uma oportunidade para a carreira artística. Passou a viver em 1936 com a cantora Dalva de Oliveira com quem teve um filho, o também cantor Pery Ribeiro.
Observando em uma ocasião o barulho dos pardais se recolhendo às árvores para dormir, sentiu que tal gesto daria um samba e compôs os primeiros versos de 'Ave Maria'. No entanto, relatou em depoimento para o Arquivo da Cidade do Rio de Janeiro: "Eu me preparei para mostrar ao Benedito Lacerda e então cantamos eu ao violão e Dalva com aquela bonita voz crente que estávamos agradando. Terminada a apresentação, o Lacerda tirou os óculos, esfregou os olhos e disse: meu compadre, isso é música de igreja, vamos fazer música para ganhar dinheiro". E assim começaram aqueles primeiros acordes com alguma desilusão. Depois a composição constituiu-se em grande sucesso.
Herivelto Martins produziu mais de 100 músicas e foi personagem muito importante na MPB. E também líder classista dos compositores. Morreu em 17 de setembro de 1992.

ESPAÇO LIVRE

O primeiro poema faz parte do livro 'Cinzas ao amanhecer' e já foi publicado aqui. O segundo, contudo, é inédito. Espero que tenham uma boa leitura.



RUPTURA

A distância de idade
faz entristecer
sem poder tocá-la
amá-la
querer.
Na ilusão perdida
meu jovem olhar.
A desesperança
humana de doar.

A minha e tua
curta existência
não poderá quebrar
diferente diferença?


PROBIDADE


Rasgo tuas vestes

cubro-a com temor

e deixo-te vestida.

Com a nudez de teu corpo.


Bené Chaves



quinta-feira, novembro 01, 2007

O texto abaixo já foi publicado aqui em 2004. Sai novamente para os que não tiveram oportunidade de lê-lo. Ou uma releitura para os demais.

O SONHO DE PAINHÔ






Quando nasci, Painhô contou que fora sob influências simples. E então, meu filho, mandei chamar a parteira, você ali, como se diz, num pé pra sair. Embora, claro, tenha sido parto normal e era sua cabeça que viria primeiro. Tenho a impressão que sua mãe sofreu pra burro, também com aquele seu comprimento todo... não sei como ela suportou tantos meses!

Tragam a toalha depressa!, gritou a parteira, Tia Chica a correr de um lado para o outro, procurando se esmerar diante do acontecimento. O certo é que todo mundo ficou nervoso. Juro que ouvi movimentos, um alvoroço dos diabos. Desejavam ver o rebento, afinal de contas aquela criança pesara mais de cinco quilos.

Você, portanto, nasceu, contou meu pai. E confesso que senti mãos amassando meu frágil corpo, embora dissessem que era um garoto bem robusto. Contudo, diante do episódio, fiquei com uma pena danada de Mainhô. Acho que não foi moleza ela suportar nove meses uma barriga tão pontiaguda e desconfortável. Sabia que a maternidade dos seis filhos traria conseqüências danosas principalmente no tocante à sua coluna dorsal. E atualmente tenho consciência disso, ela que vive a se queixar de dores nas superposições de suas vértebras e adjacências.

Mas, os de casa ficaram alegres. Champanhas foram abertas ao evento e um berço de proporções maiores estava à minha espera. Eu que seria a geração primogênita da família. Mundo meu, oh mundo meu, este menino é também seu, dizia Painhô ao ver-me nos braços de minha mãe. Seria, acho, dali em diante, senhor de atenções e atrações.Todos irradiavam contentamento, o beija-flor picava néctar das flores, as árvores surgiam com belos frutos, Gupiara parecia festejar com folguedos a parição de minha mãe. Aleluia!

E com todas essas preliminares, meu pai ainda disse que fora sob influências simples? Que ingênuo! Mas, Painhô era assim mesmo. O jeitão dele em contar casos ou causos, ora aumentando ora diminuindo de acordo com suas conveniências.

A parteira avisou: a criança é linda, linda, tem um belo porte. Você está bem, nada de preocupação, nunca vi uma mulher tão forte. Dizia isso feliz da vida, pois colocara mais um ser neste nosso, não imaginava ela, ignóbil mundo. E ainda venho saborear sua comida, falou pra Tia Chica ao sair pelo corredor, a preta velha regozijada a rebolar os quadris. Disse ainda ao meu pai que Mainhô tivesse cuidado pra não quebrar a quarentena. E que ele também se aquietasse. Mas, aqui pra nós, talvez Painhô não fosse capaz de cumprir tal obrigação e inventasse de se enxerir pra algum rabo de saia. Desconfiei e supersticiei.

Contudo, estava meu pai ali, sentado e segurando Mainhô pelo braço. E eu sendo ainda levado na barriga dela. Deitado na rede sempre armada no alpendre me disse depois que tivera naquele dia um belo sonho. E ficou a dedilhar seu violão entre uma conversa e outra com minha mãe. A inspiração, porém, pareceu fugir-lhe e ele nada cantou.


ESPAÇO LIVRE

O poema abaixo faz parte do livro "Cinzas ao Amanhecer" e já saiu aqui. Vai de novo para quem não o viu na ocasião. Espero que tenham uma boa leitura.



CANTO À INOCÊNCIA



Eu não pedi o mundo desse jeito para mim
não queria a guerra, apenas a paz
não pedi rivalidades entre os seres
somente concórdia e não poderes.
Não queria que a corrupção dominasse
a hipocrisia e falsidade se alastrasse.
Pedi justiça e não sabida esperteza
também uma simples e plena justeza.
Não, não imaginei o mundo assim...
queria sim, que ele não fosse ruim
que a poderosa e sempre disputada grana
não matasse os ditos humanos entre si
e a violência / fome acabasse para ti.
Não queria tampouco a velhice chegando
a gente, então, alcançando o triste fim
e a morte como um pesadelo enfim.
Não, não pensei que o mundo fosse...
nem para todos e, claro, nem para mim.
Um universo aparentemente belo
mas paradoxalmente não serafim.
Desejava outro mundo de amor
sem qualquer insuportável dor.

Bené Chaves