quarta-feira, fevereiro 27, 2008 |
VERSOS QUE CANTAM E ENCANTAM (24)
De João de Barro e Alberto Ribeiro:
Existem praias tão lindas cheias de luz
Nenhuma tem o encanto que tu possues
Tuas areias, teu céu tão lindo
Tuas sereias sempre sorrindo
Copacabana princezinha do mar
Pelas manhãs tu és a vida a cantar
E a tardinha o sol poente
Deixa sempre uma saudade na gente
Copacabana o mar eterno cantor
Ao te beijar fico perdido de amor
E hoje vive a murmurar
Só a ti Copacabana eu hei de amar.
Obs: Versos da música 'Copacabana'(1946), dos autores acima citados. O compositor Braguinha resolveu gravar este samba-canção com o cantor e pianista Dick Farney, que iniciava sua carreira cantando músicas americanas. Relembrou o João de Barro: 'por este motivo não foi fácil convencer o pianista a cantar em português'. E com esta gravação 'Copacabana' fez enorme sucesso de público e permaneceu nas paradas das rádios, tão em voga na ocasião. Até o final de 1947 sempre esteve disputando os primeiros lugares. Com mais de 80 regravações, entre as quais a de Jorge Vieira e Albertinho Fortuna, esta melodia encantou o povo do Rio de janeiro. Foi o cineasta americano Wallace Downey - que produziu alguns filmes no Brasil nos anos 30 e 40 - quem encomendou aos autores uma música que identificasse (musicalmente) um night-club de Nova York que tinha o título de ‘Copacabana’. Seria, então, uma bela homenagem à famosa praia carioca. João de Barro(Braguinha) e o Alberto Ribeiro fizeram juntos, além de outras canções, o ‘Balancê’(1936), já registrado aqui em agosto de 2007(vide pequena biografia na ocasião).
ESPAÇO LIVRE

Compartilho hoje com vocês do poema 'Dor', da Layla Lauar, do blogue http://www.ressacadihomii.blogspot.com/ . Espero que todos tenham uma boa leitura.
DOR
Há dias que a dor me assalta
de forma tão desmedida, aguda e inesperada
que o coração se encolhe e duvida...
(que possa suportar)
De todas as dores que sofri,
a mais dolorida
foi a dor dos meus braços,
tão vazios de ti.
quarta-feira, fevereiro 20, 2008 |
O texto abaixo já foi publicado em dezembro de 2004. Coloco-o novamente como uma alternativa para os que não o viram. Mas, o poema é inédito. Espero que todos tenham uma boa leitura. ITINERÁRIO ALFABÉTICO (1)
AFINAL, eu nasci. Demorei sim, mas surgi, talvez já tivesse incomodando Mainhô dentro de sua barriga. Se bem que depois, me parece, os embaraços vêm em maiores inquietações. Cheguei sob influências simples. Nada do sonho extravagante de Painhô. Nada de sangue azul. Nem o florir de belas flores. Era sangue vermelho mesmo, igual a todo mundo. Nasci muito a contragosto, mas tive de nascer. Claro que eu preferiria ter ficado no ventre de Mainhô. Como não tive opção, o jeito foi ser retirado pela alegre parteira. Achei que este mundo não serviria para mim, era um mundo de feridas. Feridas expostas e não cicatrizadas. Um mundo de falsidades e hipocrisias, falso-moralista. E também de incompreensões e decepções. Portanto, eis-me aqui para tentar enfrentar suas mazelas ou questionamentos ambíguos.
BEM que tinha dito: ainda moro numa fazenda, ou melhor, passo alguns dias naquele recanto agradável. O cheiro de vacaria me fazia sentir um cheiro de terra firme, molhada, terra de futuras colheitas. Mainhô é que sempre tapava o nariz quando subia no ar o odor de bosta mesmo, das vacas que sempre pastavam despejando entre as pernas o adubo de suas entranhas. E Painhô sempre metido que estava a tirar leite enquanto a pobre vaca dava uma mijada daquelas. Arre, arre! Tirava leite até altas horas da noite, quase não ia dormir. Vida boa aquela, ar puro, cristalino. Mundão aberto, cheiroso. Pena que a permanência durasse pouco tempo.
COMO entrei num colégio de padres não sei bem, mas o certo é que estudei semi-interno. Época boa, sem muitos interesses. O ruim era durar o tempo inteiro trancado. Tornei-me, então, uma pessoa susceptível e sensível. Quando o almoço era servido eu destampava o protetor e estavam lá as moscas servindo de tempero pro feijão. Enjoava aquilo tudo e ficava mais um dia de fome. No recreio não me divertia com a barriga roncando, fazia que jogava bola e fugia pra cima das mangueiras a chupar mangas espada e rosa. E depois voltava palitando os dentes com a língua. À tarde, os deveres, os insuportáveis deveres. Enquanto a obrigação não saísse correta, eu ficava mofando ali na sala quente e olhando apenas paredes brancas e janelas sujas. Ufa!, como era chato aquilo. Dava vontade de abandonar e fugir para novos ares.
DEI pra falar logo pequenininho, talvez uma precocidade advinda de ancestralidades, sei lá. Já balbuciava algumas palavras incorretas, claro, mas com o sentido voltado para a sua significação. Acho que Painhô deve ter começado a dizer algo desde cedo, não duvido nada disso. Talvez até soletrado algumas cantorias e arquivadas no diminuto cérebro. As suas célebres emboladas já deviam há muito tempo estar em formação embrionária naquela pequena cachola. Nada se podia duvidar de Painhô. E era quase certo que herdara tudo, pois o que é de bom ou ruim vem sempre de nossas raízes.
ESPAÇO LIVRE

VORACIDADE Nos teus olhos verdes e intensos cintilam minha súbita inquietude o encanto que eles me encantam no teu sorriso de fascínio e ardor.
E a tua volúpia indefinida fere o desejo que assoma meu corpo.
Na oculta ânsia em querer-te e da distância em ter-te.
Encontros que vão à quimera de contatos e castos atos.
E na minha cobiça tu a seguir comigo na madrugada frouxa de tensos devaneios. (Sonhos em exaustão).
Eu no ímpeto de desnudar-te para cobri-la com meu vasto desejo.
Bené Chaves ( Ao lado: 'Luxúria', de Jean-Baptiste-Valadie)
quarta-feira, fevereiro 13, 2008 |
  (O selo ao lado me foi concedido pelo amigo Marco Santos do blogue 'Antigas Ternuras'). VERSOS QUE CANTAM E ENCANTAM(23)
De Aldo Cabral e Cícero Nunes:
Quando o carteiro chegou
E o meu nome gritou
Com uma carta na mão
Ante surpresa tão rude
Nem sei como pude chegar ao portão
Lendo o envelope bonito
No seu sobrescrito eu reconheci
A mesma caligrafia
Que me disse um dia
Estou farto de ti
Porém não tive a coragem
De abrir a mensagem
Porque na incerteza
Eu meditava e dizia
Será de alegria
Ou será de tristeza
Quanta verdade tristonha
A mentira risonha
Que uma carta nos traz
E assim pensando rasguei
Tua carta e queimei
Para não sofrer mais
Obs: Versos da música 'Mensagem'(1945), gravada pela Isaurinha Garcia em 1946 e tornando-se um dos maiores sucessos da cantora. Antonio de Guimarães Cabral, o autor Aldo Cabral, era também teatrólogo, nascido no bairro de Santo Cristo, RJ, em 3 de fevereiro de 1912. Começou a sua carreira com uma valsa ('Boneca', gravada em 1935 por Sílvio Caldas), melodia de Benedito Lacerda, seu maior parceiro. Cabral era, portanto, um dos melhores letristas da época. E em 1937 lançou o sucesso 'Amigo Leal ', samba, na voz de Orlando Silva e cuja continuação, 'Amigo Infiel' foi gravada pelo mesmo autor no ano seguinte. Morreu em 5 de junho de 1994. O parceiro Cícero Nunes Cordeiro era também instrumentista. Aos 14 anos conseguiu um emprego para ajudar sua família, sendo operário em várias fábricas. Fez amizade, então, com um dos rapazes que tocava violão e começou a aprender e também a apreender. E compôs, a partir de 1937, principalmente sambas-choro, onde obteve o desejado sucesso. Aderiu ao samba-canção em 1944 e conseguiu melhores êxitos com 'Aquela Mulher', lançado por Nelson Gonçalves, 'Apogeu'(com Herivelto Martins), gravado em 1945 pelo Francisco Alves e o samba em questão. Cícero Nunes nasceu no Rio de Janeiro em 6 de abril de 1912(mesmo ano do parceiro) e faleceu no dia 3 de fevereiro(mesmo dia e mês também do companheiro musical). Interessante estas coincidências de datas, talvez revelando uma afinidade maior entre os dois compositores.
ESPAÇO LIVRE

DISPUTA
Na sensatez de teus atos a insensatez dos meus.
Na agitação de meu olhar a quietude dos teus.
E entre contatos opostos o existir como ritual de amores e desamores.
Em um turbilhão de laços de uma esperança ambígua.
Bené Chaves (Tela do pintor inglês William Blake -1757/1827)
quarta-feira, fevereiro 06, 2008 |
 A MORTE DO PIERRÔ
Na fria e molhada madrugada o Arlequim chorou. De saudades também de sua Colombina. Chorou depois na aurora de cinzas, da recordação de frevos e marchinhas de outrora. E na melancolia das ruas desertas, no encantamento e ilusão de épocas idas... Voltou a chorar. Era um choro amargo e, ao mesmo tempo, alegre. Na paradoxal vida de todos nós. Das despedidas do que jamais teria retorno. De uma fantasia que somente mostrava o invólucro do que já fora.
Lembrou os amores perdidos. Imaginou de quando na sua cidade existia ainda a salutar união e uma folia que se impregnava do que seria belo e autêntico. Hoje ele já não observava e nem mesmo poderia supor os cantos e encantos de um passado. Os clubes onde alargava sua alegria no miolo do salão. As danças com passos verdadeiros e bonitas composições. E o seu lamento foi tão enorme que ele não acreditava no que via. E por isso, o Pierrô chorou.
Das delícias e de brincadeiras inocentes, de confetes, de serpentinas, do lança-perfume. Das meninas de shortezinhos com o umbigo à mostra. Dos cabelos envoltos nos rostos pueris. De como o objeto retangular e de cor dourada servia apenas para jogar o líquido friozinho nas pernas e coxas das mesmas. Lembrou de como era a meiguice da retribuição ao gesto singular. De como as garotas ficavam felizes com um afago. Com um beijo na face. E do que dali poderia sair também um namoro ou algo similar.
O Pierrô chorou, chorou muito. Lembrou-se de sua meninice. Dançou, então, um frevo, jogou confete e atirou serpentina para uma avenida deserta. Derramou o lança-perfume na rua fria e solitária. Apenas ele ali sozinho, sem mais a sua companheira. Sem mais os seus amigos e sem mais ninguém. E ele voltou a chorar e a cantar e a sorrir e a soluçar de um lado para o outro na sua solidão. E saiu a pular entre os paradoxos de uma existência e desengano.
Na sua memória ficaram os momentos bons de uma época de ouro, de um tempo inocente e sem violência e corrupção e rancor. E a brutal transformação de um mundo e o progresso feroz que destrói o que o próprio ser que se dizia humano construiu. E entre as razões de um universo abjeto, o Arlequim não parou de chorar. Suas lágrimas inundaram um ilusório corredor da folia. E seus olhos incharam.
Na larga avenida de postes iluminados não vi mais nada. As luzes apagaram. Fiquei a lamentar a solitária figura de um pobre homem com seu disfarce a esconder o rosto de uma outrora alegria. Hoje apenas mesclada com a tristeza de um crepúsculo onde se baralhavam cinzas de uma quarta-feira de completa escuridão.
E o Pierrô tirou a máscara e a jogou fora. Desfez-se também de sua falsa indumentária e voltou a chorar. Neste exato instante os soluços aumentavam e faziam eco entre as pálidas cinzas de uma sumida esperança. Ele já na sua casa a olhar no espelho para um rosto nu e sem o sorriso e a alegria de viver.
ESPAÇO LIVRE
 EXTREMOS
Amando-te ou odiando-te esqueço de minha solidão da infinita procura entre o meu e o teu corpo.
Nas estreitas diferenças a invalidar o amor e o ódio.
E fugaz inquietude do nascer, viver e morrer.
Bené Chaves
|