PALAVRAS QUE INQUIETAM (19)
* Platão teria falado de que "é o corpo de tal modo que nos inunda de amores, paixões, temores, imaginações de toda sorte, enfim, uma infinidade de bagatelas - que por seu intermédio não recebemos na verdade nenhum pensamento sensato; não, nem uma vez sequer!". Completa, então, ele, dizendo: "o corpo é uma coisa má, e enquanto nossa alma estiver misturada com ele, jamais possuiremos completamente o objeto de nossos desejos, que é a verdade". Porque, afinal de contas, "tudo o que se tem por evidente não é mais que preconceito... todos os preconceitos não são mais que obscuridades vindas de uma sedimentação da tradição", diria Edmund Husserl. E a verdade, nesse caso, poderá ser uma evidência das discriminações ora estabelecidas.
* Falemos agora um pouco sobre o sonho, esse enigmático conjunto de imagens que se formam seja no sono ou fora dele. Já dizia o filósofo Barrows Dunham (O Homem contra o Mito), citado aqui anteriormente, que "os sonhos que os homens têm quando dormem são fragmentários e confusos. Os que eles têm quando estão despertos transformam-se na substância de um mundo". Embora o psicanalista Sigmund Freud tivesse dito que "eles, os sonhos, são a realização de um desejo" (no sono seria pouco provável), na maioria das vezes sonhamos dormindo verdadeiros absurdos. É como se estivéssemos em um labirinto a tentar solucionar o insondável. Aparece então um mundo totalmente surrealista, dando ensejo a mil interpretações, com isso trazendo à tona também o cineasta Luis Buñuel com seu filme Um Cão Andaluz, realização de 1928 sob a égide onírica. E temos outros exemplos, como no filme Morangos Silvestres (Bergman, 57). Na sua melhor seqüência mostra o pesadelo do personagem, condicionando todo o resto da fita, num prolongamento das ações e reações inconscientes ou não do mesmo, dando um sentido de grande alcance ao seu desdobramento.
E quem não gostaria de viver sempre sonhando com a felicidade sem exceção nesta injusta vida de constantes violências? Porque, inclusive, "este mundo é o mundo da vontade de poder e nenhum outro; e tu mesmo, tu és assim, esta vontade de poder e nada mais", disse Nietzsche, talvez querendo sufocar o desejo veemente do homem pela ambição total.
ESPAÇO LIVRE
DESENGANO
Ah, rosas vermelhas!
Quão pétalas sorrateiras
correndo tristes e soltas
no riacho da vida.
Contínuos pesadelos
de uma mente oblíqua
na vivência cinzenta
da irreversível dor .
A dor do acaso, do desamor
do amargo sabor, sem cor.
E na efêmera existência, o
ato final da dissolução
em prantos.
Ah, rosas murchas!
Bené Chaves
por
benechaves às
11:20