Soube que minha mãe discordava e dizia detestar (ou ignorar) o mundo da sétima-arte. Tinha de mentir ou fugir quando a mesma desconfiasse de algo incomum, pois era evidente que não teria grana para ver as fitas em série que acostumei a apreciar. Se acontecesse algum imprevisto, iria, lógico, apelar para meu pai, que daria o dinheiro para a tal sessão. Antes jurava não me embaraçar nos estudos. De maneira alguma, dizia eu, não vou me prejudicar, pode confiar. E saía apressado e medroso ante uma possível presença de Mainhô tentando, talvez, me impedir do lazer semanal. Eles lá que depois discutissem o assunto. Esperava apenas que Painhô interferisse a meu favor e mudasse a opinião de sua mulher, acho que com algum esclarecimento em nome da cultura e arte cinematográficas. Era só o que faltava!, exclamava. Tenho certeza que minha mãe não sabia o que estava perdendo.
Corria, portanto, e ia parar na calçada do velho edifício. Mais tarde entrava e me sentava em uma cadeira nada confortável. Nem ligava naquela condição de menino ainda besta, queria somente admirar, com vivo interesse, o que se projetava na telona. Antes, porém, me juntava aos amigos e ia trocar figurinhas que colecionava em um bonito álbum. E, horas depois, lá voltava eu contente a mostrar as ilustrações já quase preenchidas. Trancava-me no quarto a colar com entusiasmo a posse das fotografias. Se minha mãe não fosse chamar, ah!, esquecia até de comer, passando o resto do dia sentado no chão a selecionar o objeto da conquista. Em seguida surgia na sala com o livro de cartolina faltando apenas quatro ou cinco fotos para completá-lo. E mostrava aos meus pais a feitura realizada, ficando na intenção de concluir o trabalho meio artesanal com a ajuda dos mesmos. Se as figuras não saíssem repetitivas, o que era comum, logo estaria com o álbum completo. Sei que aí já existia astúcia e ambição na demanda, mas não iria amolecer, queria arranjar uma grana para terminar meu intento. E, em um curto espaço de tempo, sair feliz a contar vantagem para os amigos da época.
Efêmero, irrequieto
terno, platônico
duradouro, atônito
carnal, sólido
diluído, mortal
eterno amor.
Quanto dilema
afeição, tesão
problema, feição
tensão, sistema.
Ah, esse amor!
Quão pudor
louvor, ardor
despudor, fulgor.
Quanta dor!
Bené Chaves
por
benechaves às
18:59