Tive de ir depois ao colégio e meter a cara nos estudos, providenciando também o jornal-mural para que expuséssemos na parede externa da classe. Logo todos estavam curiosos pelo mesmo, menos no que dizia respeito em ler as notícias em si e mais pelo exagerado desejo de tudo ver e saber. Algumas pessoas imprudentes que apenas se limitavam em observar, inoperância que já se tornava comum em nosso meio e que com a continuidade do civilizável (ou não), tenderia a diminuir ou crescer. Mas, estavam lá as matérias na exposição, eram comentários feitos sobre como descobrir um meio de melhorar as coisas. E conseqüentemente ajeitar as mentes tortas e indiferentes, sobretudo ingerência nos desmandos de uma sociedade que se prenunciava e se pautava contrária à razão.
Então, diante também de tudo isso, ficava esperando que a semana logo terminasse, pois teríamos a sessão de cinema no sábado. Estava programado um filme que os admiradores da sétima arte (e eu como um deles, evidente que sim) contavam ter sido elogiado pelos críticos de um modo geral. Em Qualquer parte da Europa, produção de 1947 e dirigido pelo húngaro Geza Radvany, mostrava também o desespero principalmente de crianças em uma cidade destruída pela guerra, meninos (as) famintos a procura de um lar. A crítica, que se dizia especializada e na época era nossa fada-madrinha, falava de dois momentos que sobressaíam e elevavam a fita ao topo: a cena do fuzilamento e a morte do menino-herói, o que era líder do grupo.
Logo que observei o filme, pude avaliar que se tratava de um relato pungente acerca dos maus passos dados àqueles sem chances de defesa. Era um chamamento aos princípios que regem os interesses de uma comunidade, narrado sem firulas e num fabulário digno de seu autor, desde já capacitado para assuntos desta natureza. Infelizmente tive apenas uma visão adolescente do problema, porém, a partir de então, galgando patamares para uma maturidade que iria se avizinhando. E, claro, a fita húngara deve também ter despertado algumas sensibilidades presentes no auditório daquele ainda pequeno colégio de Gupiara. Daí, talvez, partíssemos, alguns de nós, para uma inquieta conquista no campo social, nós que ainda sonhávamos com um mundo perfeito e utópico.
Não existia regularidade na programação que fazíamos, acho que devido aos obstáculos de se conseguir bons filmes. E, trinta dias após, vimos um tema parecido e que falava da solidão e da miséria humanas. Era a história da dificuldade de sobrevivência de velhos e pobres, enfocando, sobretudo, a desesperada existência de um aposentado que não tinha o mínimo auxílio, sujeitando-se, inclusive, a pedir esmola. Uma mão estirada à necessidade e ao mesmo tempo encolhida à vergonha.
E enquanto Em Qualquer parte da Europa denunciava a infância abandonada, contrastando com Umberto D de Vittorio De Sica, que revelava a velhice na mesma angústia, fita sob a bagagem do neo-realismo italiano, produção de 1951, víamos, antes de tudo, entre o novo e o velho, um apelo à solidariedade e uma pintura lúcida de uma realidade ainda em voga. Poderíamos também dizer que os dois filmes seriam uma poesia aos nossos olhos de mocidade.
Uma semana depois nossa agremiação exibia Dois fantasmas vivos, com o gordo (Oliver Hardy) e o magro (Stan Lauren). Seria uma pausa nos temas fortes mostrados anteriormente. E um riso sempre aberto às adversidades de um sistema mordaz e voraz que começava a palpitar em nossas ainda iniciantes existências.
ESPAÇO LIVRE
Amigas e amigos
Vou ter de me ausentar uns vinte dias, aproximadamente, para tratar de assuntos particulares. Fico triste porque no dia 01 de agosto este o apanhador de sonhos fará um ano de existência e não estarei no ar para possíveis e eventuais comemorações. Mas, espero logo voltar ao convívio das amigas e amigos que sempre vêm aqui para comentar o que escrevo. Agradeço a todos que assim o fazem.
Portanto, até um breve dia...
Bené Chaves
por
benechaves às
21:36