Fiquei surpreso diante da atitude de carinho de Gracita e retribui-lhe o afeto com um leve beijo na face, sem antes olhar se via algum vulto ao redor. Tinha medo que aparecesse alguém e tudo fosse por água abaixo. Eu estava abatido, perplexo mesmo diante de acusações e frustrações de pessoas alheias a um convívio sadio, com toda certeza pessoas malambeiras. Não tinha sido mole a encrenca que fizeram, mas, agora, parecia ir tudo bem. Pelo menos aparentemente... Ou seria alguma simulação, um interregno?
Passado o incidente de que fui vítima apressei-me a encarar minha namorada com mais assiduidade, procurando sempre estar ao seu lado para evitar posteriores e possíveis pseudoverdades a sua pessoa. Não iria admitir que inescrupulosos e maldizentes fossem interferir na nossa relação. Era, sem dúvida, gente inditosa querendo desenlaçar aquela união adolescentemente sacudida. Dito e feito parti como se fosse para uma batalha. Uma inconcludente, inarredável, paradoxal e gostosa batalha.
Portanto, tudo seguiu, dali em diante, seu rumo normal e sem novidades. Alvíssaras!... Como as coisas eram ainda delicadas e se tratando de um namoro recente e logicamente na pós-puberdade, Gracita saía comigo sempre acompanhada de um parente. Claro que eu não gostava da atitude de seus pais, pois pareciam ver-me como uma pessoa sem confiança. Mas, eram os hábitos da época, embevecidos por uma sociedade sempre faladeira. Aliás, esta prática é antiga e talvez sujeita a conservar-se anos seguidos, pois desde períodos rudes e rudimentares ela permanecia entre nós. Infelizmente numa escala ainda calamitosa para aquele momento de então. (Aos poucos, no entanto, ficou-se sabendo de seu desuso, devido mais a uma insolência dos jovens e do avanço do tempo e menos da intransigência de alguns rígidos pais).
Paralelamente à insensatez de alguns, pude, claro, preservar minha insígnia e mostrar também que era um jovem correto e que em todo o tempo buscou a verdade. Minhas amigas e amigos que o digam, como também antigas paqueras. Atormentasse ou não, avaliava uma vida melhor para todos. E que as pessoas conseguissem, num curto espaço de tempo, a liberdade avocada. Mesmo que fosse arrotada na base do sacrifício, em combates de qualquer natureza.
Porém, nem tudo são flores neste mar de amores e desamores, sabores ou dissabores, já dizia dona Dolores.(A senhora em questão era uma velha prudente e que calculava com profunda sabedoria suas frases lapidares, ensejando inclusive aqui uma rima com seu próprio nome. Acudo-me, portanto, de suas virtudes). E no caso de meu namoro com Gracita, o mal voltou a sobrepujar o bem, enquanto substantivo masculino.
ESPAÇO LIVRE
ESPELHO
Na ilusão perdida vi a
tentativa de rejuvenescer
teu corpo triste, curvado.
E a imagem doce acolhendo
as últimas esperanças.
Aquela de ser como símbolo
da vida imortal.
Lutando contra o acaso
enfurecido de desejos
ante olhares de títeres.
Bené Chaves
por
benechaves às
11:04