Ou então - quando rapazinho - se atreveu no traseiro de alguma jumenta, perto daqueles roçados e cercanias.O que era comum entre os vaqueiros da região. Já que as moças se faziam de supostamente difíceis, o jeito que tinha era procurar satisfação em caminhos não tanto agradáveis.
Quem contou as peripécias foi Painhô mesmo, na noite silenciosa e com leves ruídos na escuridão. Imagine!... até Tia Chica ficou escorada no balcão da janela. E, então, ele disse, todo ancho da vida:
"Era uma noite, parece, de lua cheia, as nuvens cobriam pouco a pouco um céu meio azulado. Dava uma aparência que ia chover, porque o quarto escureceu de repente. Levantei-me -depois de um bom sono - e fui à sacada da janela vislumbrar o acontecimento. Quando voltei, minha companheira ainda dormia agarrada ao travesseiro. Fui ao seu encontro e deitei juntinho dela para acordá-la. Ela remexeu-se com preguiça e puxou-me para seu lado. Ficamos ali quietinhos horas e mais horas, nossos rostos colados um ao outro".
Parou um instante com se quisesse tomar fôlego. E continuou meio envaidecido:
"Alegre e mostrando felicidade ao redor de si, sua mãe, meu filho - e me olhou piscando o olho de contentamento -, ergueu-se e levantou-se contente da vida. Estava radiante, sem acreditar, e foi tomar seu banho natural. Ninguém a detinha, talvez levasse com ela o fruto de uma existência".
Prosseguiu com sobriedade e distinção:
"O tempo voltou a piorar e a lua tinha sido encoberta. As nuvens tomavam conta de tudo e eu temia uma arbitrariedade daquela ocorrência quase inusitada. Daí resolvi encará-lo e deixar minha companheira na ventura acontecida. Olhei ao redor e vi uma vida mesclada, aquelas pessoas numa formalidade de afazeres, gesticulações de incertezas, gente andando e sendo fustigada, olhares atônitos e atônicos".
Parou um pouco, disse que ficou alguns momentos na chuva e depois voltou ao quarto, onde a parceira ainda dormia ao sabor de seu deslumbramento. E falou: "sim, meu filho, você foi gerado naquela ocasião, tenho quase certeza. É por isso que estou lhe contando o sucedido".
Não sabia ele que Tia Chica ficara escondida no parapeito e com certeza ouviu o relato desse pequeno e feliz episódio quando Mainhô sentiu as delícias do prazer pela primeira vez.
Levantou-se e se dirigiu ao aposento, pois sua mulher já dormia fazia algumas horas. Tivera uma bruta dor de cabeça que disse infernizar-lhe as têmporas.
Eu não falei que se chovesse ou não, tivesse lua cheia ou nova, fizesse sol ou noite estrelada Painhô era um danado?! E antes de entrar vi somente o vulto da preta velha correndo para não ser apanhada em flagrante.
Þ A cena final de "Oito e Meio" (Fellini,63), com a estupenda partitura musical de Nino Rota dando relevo maior ao clima da ciranda da felicidade.
Þ A longa seqüência inicial de "Hiroshima meu Amor" (Resnais, 59), com mais de cinco minutos de inventiva e transgressora narrativa cinematográfica.
Þ A cena rápida de "Rastros de Ódio" (Ford, 56): a porta que se abre e fecha no final é toda uma síntese da mitologia do gênero.
Þ Do sofrimento e da dor surgem o prazer e o gozo (a bela suíça Irène Jacob em "A dupla vida de Veronique", Kieslowski, 91), talvez numa das mais belas cenas que vi nos últimos anos. É impressionante: ela sai do pranto e entra num estágio de êxtase, dando seguimento ao desfecho de um orgasmo delirante.
por
benechaves às
10:56