Ali, ele tirava algumas poucas latas do leite morno e espumante e enchia copos e mais copos, depois distribuindo nos arrabaldes, aquela população agradecendo sua generosa atitude.O que sobrava dava pra encher a pança dos que moravam na fazenda.
Ele era feliz e sabia que era. Sou um sujeito simples e sem lengalenga, costumava falar. As pessoas gostavam dele, principalmente aquelas mocinhas que viviam à cata de um marido pra arrumar suas vidas.(Mas aí já existia um certo interesse, menos pelo que possuía e mais pelo belo porte de masculinidade).
Meu avô não tinha muito, mas o pouco que tinha ajudava muita gente. E essas coisas no sertão são de grande valia para todos.
Porém, depois Painhô pegava seu chapéu de couro e se metia no mato em busca de serviço. Eu gostava daquilo, dizia ele sorrindo.Acho que foi nesse período que Painhô começou a tocar violão. Embora com a sequidão quase cruel, imaginava o gado pastar livremente. E as bostas das vacas caírem em abundância naquela terra, dando adubo pros terrenos sedentos de água.
Após tomar uma coalhada gostosa feita mesmo pela mãe, dele, lógico, sentava-se na pequena varanda e, antes de cantar algo, soltava um arroto de desprendimento, mansidão e olhando aquela imensidão. Os cantos melódicos e às vezes românticos enchiam o corpo de todos de um prazer incomum. Ladrões inexistiam, a violência não campeava e, portanto, a noite seria nossa.
Meu avô dizia pra Painhô que macho que é macho tem de provar de vários melaços. Pra saber o melhor e ficar comendo, completava, desviando o olhar de sua mulher.Meu pai, então, atiçou:
Aqui neste sertão
Mulher é feito pilão
Sem tripa sem tudo
E também sem coração.
Só por causa de uma urupema
Quanto mais se ela visse
Meu namoro no cinema.
Não sei porque falou isso, porém falou. Era assim mesmo, cheio de improvisos.
Levantou da cadeira, deu boa-noite e foi dormir. Amanhã cedinho reiniciaria novas tarefas.
CINEMA
SEQUÊNCIAS E CENAS ANTOLÓGICAS(1)
Þ A seqüência final de "A Doce Vida"(Fellini, 1960), com a podridão de um mundo ruim sobrepujando a inocência no rosto suave da menina-moça.
Þ A cena final de "Luzes da Cidade"(1931), de Charles Chaplin, quando a florista reconhece no seu protetor a figura do vagabundo. É de arrepiar!
Þ A seqüência inicial de "A Marca da Maldade"(1958), com todo o movimento e inquietação da câmera.
por
benechaves às
21:35