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Bené Chaves <>, natalense, é escritor-poeta e crítico de cinema.
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a explovisão (contos, 1979)
castelos de areiamar (contos, 1984)
o que aconteceu em gupiara (romance, 1986)
o menino de sangue azul (novela, 1997)
a mágica ilusão (romance, 2001)
cinzas ao amanhecer (poesia, 2003)
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terça-feira, março 25, 2008

('Mulheres protestando', de Di Cavalcanti)


VERSOS QUE CANTAM E ENCANTAM (26)



De Assis Valente:

Chegou a hora dessa gente bronzeada

Mostrar seu valor

Eu fui à Penha

E pedi à padroeira para me ajudar

Salve o Morro do Vintém,

Pendura a saia que eu quero ver

Eu quero ver o Tio Sam

Tocar pandeiro para o mundo sambar

O Tio Sam está querendo conhecer a nossa batucada

Anda dizendo que o molho da baiana melhorou seu prato

Vai entrar no cuscuz, acarajé e abará

Na Casa Branca já dançou a batucada de Ioiô e Iaiá

Brasil, esquentai vossos pandeiros, iluminai os terreiros

Que nós queremos sambar

Há quem sambe diferente, noutras terras, outra gente

Um batuque de matar

Batucada, reuni vossos valores, pastorinhas e cantores

Expressões que não tem par, oh meu Brasil, Brasil

Brasil, esquentai vossos pandeiros, iluminai os terreiros

Que nós queremos sambar.

Obs: Versos da música 'Brasil Pandeiro' (1941), do autor acima citado. Este samba o Assis Valente compôs para a Carmen Miranda, após seu período inicial nos Estados Unidos. E como a Carmen não gostou da composição, a mesma acabou sendo lançada pelo 'Anjos do Inferno'. Sendo uma espécie de samba-exaltação, foi o preferido pelos maiores conjuntos vocais de seu tempo.
José de Assis Valente era, já aos 10 anos, um admirador de poetas como Castro Alves e Guerra Junqueiro. E sua paixão pela 'pequena notável' chegou até ao extremo do mesmo tentar aprender a tocar, pensando que o professor fosse pai adotivo da cantora. (O que não faz uma paixão, hein?). Compôs, então, outras canções e dedicou à sua amada. Mas - como teve uma vida bastante agitada - desesperado com as dívidas( e acho que também com as dúvidas), tentou o suicídio algumas vezes.
Enfim, senta-se num banco de rua e ingere uma quantidade suficiente de um produto químico para matar formigas. Deixa um bilhete à polícia tendo antes telefonado para dois amigos comunicando-lhes a decisão. Pede também para o Ari Barroso pagar dois aluguéis que estavam atrasados.
No bilhete, o ultimato: 'Vou parar de escrever, pois estou chorando de saudade de todos e de tudo'.
Assis Valente nasceu no dia 19 de março de 1911 em Santo Amaro, na Bahia. E faleceu no Rio de Janeiro em 6 de março de 1958. Suas composições traziam, sobretudo, um conteúdo poético. É o caso de 'Boas Festas':

Já faz tempo que eu pedi
Mas o meu Papai Noel não vem
Com certeza já morreu
Ou então felicidade
É brinquedo que não tem.


ESPAÇO LIVRE


SAUDADES


Entre os limites da existência
a tua infância querida
os bons anos adolescentes
e a maturidade aferida.

Na velhice os efeitos e sinais de
uma vivência de (in)glórias
ocasos e épocas que se foram
na sombra de um breve passado.

E no pranto ou prazer do encanto
o desencanto de uma ilusão.

A minha, perdida no temor.
A tua, um acaso de incertezas.


Bené Chaves



terça-feira, março 18, 2008

ITINERÁRIO ALFABÉTICO (3)







(Quadros da pintora russa Tamara de Lempicka )



IDEAL também dizer: gostava de jogar bola. A gente formava um time, respeitado, eu, no meio dele, metido a bicho medonho, conhecedor da arte de lidar com a pelota. Espaços compridos possibilitavam o aproveitamento da área larga. E naquele campo não-oficial dominava o redondo objeto de couro como se fosse um verdadeiro craque. Voltava à noitinha, cabisbaixo, recebendo carões. Mainhô parece que só queria me ver nos estudos, nada de distrações extras. E dizia: você, hein?, por acaso disse pra sair? Botava-me de castigo e lá ficava eu mofando e olhando para aquela horrível parede descolorida. Saía desconfiado, os pés doídos. Esmurrando o muro, sem cor, teimava em largar tudo enquanto Mainhô se enfezava com minha atitude, para ela, um modo de proceder desrespeitoso. Seria depois surpreendido a jogar botão de mesa...




JOVEM ainda voltei pra fazenda. Cheguei, montei um dos cavalos bonitos e saí a trotear gostoso pelo espaço aberto do campo, aquele lugar desabitado onde predominava os cantos dos passarinhos e o cheiro do ar puro, a vastidão das matas florestais a nos trazer saúde. Vidinha mansa, como diria Painhô. Aliás, foi ele quem me ensinou a montar naquele alazão formoso, bom da peste, no modo de dizer, claro. E eu pulava em cima do animal e vez em vez levantava suas duas patas e segurando nas rédeas, chicoteava-o, ele abrindo as ventas e rinchando um grito talvez de dor. Saltava com ele, então, aqueles enormes cardeiros e xiquexiques que se punham à nossa frente. E o alazão elevava-se com vigor, feito menino, éramos então duas crianças a correr estrada afora como se estivéssemos num campo de hipismo. Depois tudo acabou: a criação da fazenda foi devassada e devastada, acho que meu cavalo morreu quando a máquina chegou. Feiíssimo e horrível... O progresso matara a ingenuidade e o ar escurecia. E a gente teve de correr às pressas. Homem e máquina: natureza perdida.




KNOW HOW eu ainda não tinha nenhum, mas com certeza e o passar dos anos iria adquiri-lo sem pestanejar. Seria questão de paciência e tempo também. E principalmente estudo. Portanto, dali em diante teria de me esforçar para entender tudo. E Painhô certamente ensinaria o que ele já aprendera na vida.




LUTEI desde criança para manter boa aparência. Com idade de quatro ou cinco anos todos gostavam de mim. Ao menos imaginava que fosse. Um gênio ou um imbecil? Nem uma coisa e nem outra. Disso sei: nasci com aquele belo porte que tanto a parteira avisara. Mas, depois, é lógico que a gente, no crescimento, perde algo e fica frugal. Ou vice-versa. E parece que os cinco quilos e duzentos gramas se malograram e diluíram com a idade avançando e fui ficando magro, mas, ao mesmo tempo esbelto, no que redundou depois um rapaz, modéstia à parte, de estatura modelar. Que o dissessem depois as mulheres... E que mulheres! Nem gosto de pensar, pois me dá uma saudade danada de um tempo que ficou perdido entre as sombras de uma ilusão. E com ele, o tempo, tudo se dissipou e depois acabou. Restam, atualmente, lembranças de uma época onde a inocência e a felicidade não tinham data para cessar. E tudo que a gente fazia sentia um sabor agradável do desmedido.



ESPAÇO LIVRE

POSSESSÃO

Quero vê-la
com tesão
tomá-la inteira
no segundo
minuto
hora.

Você é meu desejo
o painel
pincel
ensejo
as cores
de babel.

Sem algum temor
devo fantasiá-la?

Ao extremo gritar
uma finda dor?

Bené Chaves

(Ao lado: arte de Fernanda Fonsêca)



terça-feira, março 11, 2008



VERSOS QUE CANTAM E ENCANTAM(25)


De João de Barro e Antonio Almeida:

Fiz meu rancho na beira do rio

Meu amor foi comigo morar

E nas redes nas noites de frio

Meu bem me abraçava pra me agasalhar

Mas agora, meu Deus, vou-me embora

Vou-me embora e não sei se vou voltar

A saudade nas noites de frio

Em meu peito vazio virá se aninhar
A saudade é dor pungente, morena


A saudade mata a gente, morena

A saudade é dor pungente, morena

A saudade mata a gente


* * *

De Antonio Almeida e Constantino Silva:


Ontem cheguei em casa, Helena / Te procurei


E não encontrei / Fiquei tristonho a chorar

Passei o resto da noite a chamar

Helena, Helena / Vem me consolar

Mesmo depois de cansado / Teu nome falava baixinho
Helena dos meus encantos / Vem me fazer um carinho


E fiquei desesperado / Cadê Helena, meu bem

O dia já vem raiando/ E a minha Helena não vem

(Por que será?)


Obs: Versos das músicas 'A Saudade mata a gente'(1948) e 'Helena, Helena'(1941), dos autores acima citados. O samba-toada de Braguinha e Antonio Almeida fez enorme sucesso com o cantor Dick Farney no ano de seu lançamento. É uma canção que explora o amor singelo ambientado na vida campestre. E o êxito maior deve-se mesmo ao Farney que conseguiu uma brilhante interpretação. E o sucesso foi alcançado.
O Antonio Almeida faria parceria também em 'Helena, Helena', que foi o primeiro grande samba-carnavalesco a se destacar pela melodia bem valorizada pelo conjunto 'Anjos do Inferno'. Compositor e cantor nascido em 26 de agosto de 1911 em Vila Isabel, no Rio de Janeiro, desde sua juventude que ele frequentava gafieiras, ranchos e blocos.
Em 1932 estreou como cantor no programa 'Horas do outro mundo', na Rádio Phillips, no Rio de Janeiro. Foi autor de vários números para shows da Urca(Rio) e de Icaraí(Niterói). Lançou também os primeiros concursos e em 1946 promoveu um para a escolha da mais bela mulata. E compôs, então, 'A Mulata é a tal '(que foi sucesso no carnaval de 1948) com o João de Barro e em homenagem à vencedora do citado concurso.
Faleceu em 9 de dezembro de 1985.
Sobre o seu parceiro Constantino Silva, o Secundino, não consegui levantar dados biográficos, apenas que compôs o samba-batuque ‘Lamento Negro’(1941) em parceria com o Humberto Porto e gravado na Columbia pelo ‘Trio de Ouro’ e ‘Parece Mandinga’, de parceria com Nelson R. da Silva, também de origem desconhecida.


ESPAÇO LIVRE

BREVIDADE


Ao amanhecer e entardecer
eu ti vi ainda criança.

E na madrugada adormecida
tu já eras uma mulher.

No efêmero vôo de um tempo
que se diluiu em sombras.

Passadas, presentes e
futuras.

E no arcabouço que restou de
nossas ambíguas existências.

Bené Chaves


(Ao lado: foto de Natasha Lyonne, in 1000 imagens)



quarta-feira, março 05, 2008


(A bela Kim Novak no início de carreira)

No texto abaixo, a continuação de mais um 'itinerário', visto aqui em 2004.

ITINERÁRIO ALFABÉTICO (2)

EM frente, quase perpendicular, onde Painhô e Mainhô moravam, existia uma pracinha, acanhada, com uma casa onde vendiam peixes, limitado lugar também de gostosas iguarias. Nem tanto como as comidas de Tia Chica, porém a freguesia se reunia no local. Mas, eu ainda pequeno, talvez com uns sete anos, presenciei, sem querer, claro, um crime nas imediações da mesma. Foi horrível para a minha idade. E Gupiara começara, aos poucos, a mostrar uma outra face de sua existência. Lembro vagamente: tardezinha, um cidadão, sem motivo aparente, pegou seu revólver e atirou, pum!, pum!, pum! E, depois, com uma faca, ainda cortou metade da orelha do pobre homem, saindo com a dita na mão, o sangue misturado, o outro estendido na barafunda. Nunca souberam o paradeiro do criminoso e ele certamente desapareceu para sempre. Seria o início, talvez, de casos sem soluções e crimes que compensassem suas autorias.



FUI logo sabendo que o pequeno comércio que Painhô instalou em Gupiara começava a dar bons lucros. Vez em vez ele mandava me chamar para ajudá-lo naquele Armazém varejista. E eu até gostava de ficar ali pesando quilos de arroz, feijão ou farinha, feito menino instruído, sabichão. Meu pai da porta olhando pro próspero movimento, às vezes piscando para a bonita moça (não tomava jeito esse Painhô...) em frente, outras vezes me observando com atenção. Claro que ficava direitinho, necessitava muito da minha mesada, pois queria tanto ir a um cinema...



GARANTO que cheguei logo a ler e escrever, claro, fui um menino educado, não dei trabalho a ninguém, Mainhô que o diga. Uma vezinha ou outra a gente perde um pouco os bons costumes, mas é coisa sem importância. O chato mesmo é a vida desassossegada, estudar, estudar, depois trabalhar, trabalhar... A gente devia viver brincando, ora essa! O divertimento nos dá saúde, despreocupação. E as obrigações diárias cansam nossa mente, às vezes com tarefas supérfluas apenas como vaidades bestas, ambições, troços levados como supremacias. A modesta inteligência ancestral (acho que em grande parte de Painhô) que herdei deve ter me facilitado sem precisar ficar com os olhos grudados em livros ou cadernos. Penso que a consciência fluiu espontaneamente e fui absorvendo quase tudo com melhor facilidade.



HOUVE um tempo muito bom em minha vida: coleção de revistas de cinema com artistas na capa e tudo. Possuía um álbum com todas aquelas lindas mulheres à minha frente. E me deliciava num cansaço quase extremo vendo Kim Novak, Gina Lollobrigida, Ava Gardner, Cláudia Cardinale, Ingrid Bergman, Brigitte Bardot, Silvana Mangano e outras lindas atrizes mostrando as pernas em variadas poses. Coxas? Às vezes apareciam sim... Também naquela época... E às vezes só um tiquinho de nada, o que era uma pena enorme. Mas, que teria sido uma beleza perscrutar o corpo nu de uma miss Novak, por exemplo, claro que ninguém duvida disso. E as lindas mulheres passavam junto de mim o dia inteiro, principalmente quando ia tomar um salutar banho. Aí, então, flutuava na minha imaginação e o ralo do chuveiro era quem recebia toda a descarga. Atrizes em ruma, oh, fascinantes... E os citados periódicos se amontoavam para o meu bel prazer. Tempo bom que não voltará jamais. Porém fico com aquela bela recordação de que gamei em todas, revistas e mulheres, seria evidente que sim. E o prazer que senti nos meus primeiros anos de uma pré-adolescência.


ESPAÇO LIVRE


REVERSO


Na ilusão da vida
a tua doce presença.

E na certeza da morte
a tua sentida ausência.

Os dois lados distintos
a se rebelarem contra
os frágeis e opostos
sentimentos.

O prazer e a dor!

O amor e o ódio!

O ter e o ser!


Bené Chaves